"Uma mosca efêmera nasce às nove horas da manhã nos dias longos do verão, para morrer às cinco horas da tarde; como compreenderia a palavra noite? Deem-lhe cinco horas mais de existência, ela verá e compreenderá o que é a noite."
(Stendhal in O Vermelho e o Negro)

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Ele... Essa presença que me consome









Ele... Essa presença que me consome

*
?Que presença é essa
Que não vejo e me consome...
Que esquece o meu nome sem rima na língua, na carta de amor...
E me chama pelo nome de outra no lapso do céu da boca,
no lodo do eco dos dentes, no ato falho dos porões da memória...
***
?Que presença  é essa
Que me pretere no fio corrosivo do prazer da vingança
No amargo sabor do lento passar das horas
Enquanto, à distância, velo o meu amor 
Suturo e nutro com lágrimas de renda a minha saudade 

***
?Que presença é essa
Que nunca está 
Gotas de suor... cristais, que não escorrem em mim
Que não oferece a indulgência-talismã-relíquia de um cílio caído, fio de cabelo, unha
Um cheiro entranhado na roupa suja perfumada de outros passados


***
Que presença é essa
Que não colhe murchas acácias caídas no chão do outono
Que não faz um leito sedoso de folhas verdes
das mangueiras doces para o meu corpo deitar
Que não me encontra encantada nas matas D'Oxossi
Que não me banha nos afluentes secretos dos rios do norte


***
?Que presença é essa
Que cospe nas fendas fiéis das minhas  letras esculpidas de sangue e fogo
Mas engole, aos pares, como as doces uvas de Baco, 
Insossas palavras de poemas incertos 
E venera a prosa d'outras mãos que lhe afagam e seduzem o ego com duvidosos clichês

 
***
?Que presença é esta?
Essa presença concreta na ausência
Que sinto absorta, distantemente, muito perto de mim
Viva e pulsante no tempo correndo do instante ofegante

***
?Que presença é essa
Amante dos meus ouvidos alter(n)ados
No nada da pele que só se sabe desejo
E se veste nua de sonho acordado
Para outra vez, no sonho adormecido poder abraçá-lo

***
?Que presença é essa
Essa presença é Ele, eu sei
Essa presença Sou Eu, 
Disso, ele sabe, ele grita, ele sonhou primeiro
E nenhum dos dois pode evitar

*

Desfazer, jamais!
Amor compartilhado
O Tempo diz.

Roberta Aymar
06.03.2011

*****
?Dirá? 
 
Roberta Aymar
13.06.2011


Postado Originalmente no Blog TECIDO VIVO

 








2 comentários:

  1. Roberta Aymar

    Você consegue transpor o leitor para o palco da sua habilidade profissional de saber alargar, ao infinito, horizontes mentais. Dispõe destra técnica de contruir naves que conduzem instantâneamente o homem da terra rumo às estrelas, e ainda deixa-o independente porque não pretende dominá-lo, uma vez que a sociabilidade não lhe apraz, sinceramente falando. Sobretudo pelo fato natural da sua rebeldia ligada com sua independência destrancar qualquer possibilidade de convenções.
    Propriamente sobre "Ele...Essa presença que me consome" poderia ser o texto da lavra de Homero, assim como poderia o escrito ser fruto de uma paixão que lhe convém retornar posteriormente para ainda se permitir a um tempestivo diálogo, autointerrogando... Não importa, nada disso importa, já que a intenção, cheia de sutilidade, é preparar o terreno para que a obra possa ser realizada na excêntrica perspectiva que lhe é peculiar.
    É preciso ter bagagem para se escrever assim.

    Walker Lima

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  2. Quando escrevi esse "poema", para "ELE" (essa presença que me consome), ele disse:
    - "Tecnicamente, muito bom!"

    _ (C'est la vie!)

    No poema, Walker, não está a minha "habilidade profissional" nem há "destra técnica". Não tenho técnica, não tenho nada além de uma enorme vontade reprimida de escrever.

    Obrigada pela atenta leitura e pelo delicado comentário.

    Roberta Aymar.

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